Editorial extraído da edição de junho de 2024 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos editoriais, clique aqui.
De tempos em tempos, fazemos um compilado de motivações para seguirmos impressos. O primeiro argumento é simples: gostamos dessa forma de existir. Depois, comumente citamos
- a) a conexão física, a experiência sensorial em si de folhear um jornal;
- b) o ritual de leitura, aquilo do jornal no café da manhã de domingo, abrir o malote para, então, ler de acordo com as próprias manias;
- c) a experiência offline, com menos distrações, menos desvios de atenção: jornal impresso não tem pop-up nem notificação de tela;
- d) o apelo visual, afinal, nos entendemos vulgarmente como um jornal de arte com uns textos dentro, e a cada edição procuramos entregar um produto de valor estético que não seja perfeitamente reproduzível em um… PDF (ou você se pega dizendo “que PDF bonito”?);
- e) outros argumentos que envolvam materialidade para caixinhas de pet, hábitos tradicionalistas, tangibilidade, acessibilidade, curadoria, limite: imagine que podíamos ser uma edição com 893 melhores textos. A edição de junho entrega apenas 10 textos.
Também não negamos que oferecemos limitações visíveis ao consumo: jornal molha, rasga, gera ansiedade visível da não leitura, amassa, avoluma, amarela. Nem precisamos nos estender nisso porque o nosso entorno reforça tais déficits o tempo todo. Entretanto, reconhecemos ultimamente uma nova não vulnerabilidade, vista principalmente em nativos digitais e em seus apelos por rentabilidade (nós também fazemos apelos – não estamos julgando, apenas constatando).
Pois vejam: em um mundo cada vez mais dominado por algoritmos e por tráfego pago, o jornal impresso pretende se pagar já em sua materialidade, sem a necessidade direta do pedágio das redes. Paga-se – você paga – para receber 12 edições de papel.
Sabemos que jornal custa caro, da gráfica ao Correios, mas a operação é muito mais previsível que a dos meios de comunicação, cada vez mais dependentes de – e, portanto, vulneráveis a – qualquer ligeira mudança das plataformas contemporâneas. Os Correios podem fechar? Sim. As gráficas podem triplicar o preço da tiragem? Também. Porém, estes são elementos de jogo muito mais jogáveis, a nosso ver, que a disputa por atenção e o desespero com mudanças nas políticas de monetização nas redes.
Podemos observar essa resistência (ou teimosia) a partir da lógica do Efeito Lindy. Inicialmente, a constatação de seu criador, Albert Goldman, em 1964, foi: “a expectativa de futuro de carreira para um comediante de televisão é proporcional ao total de exposição no passado pela metade”. Então simplificamos para uma regra de bolso: se X existiu por Y anos, podemos presumir que existirá por mais Y (ou metade de Y, como propôs Goldman).
Assim, se o seu projeto artístico, negócio ou relacionamento depende de redes sociais criadas semana passada ou de algoritmos ajustados ontem, é muito mais provável que ele esteja vulnerável (e desapareça) a partir de mudanças nos algoritmos atualizados hoje ou redes sociais evaporadas semana que vem. A nossa inadequação, quem sabe, seja a nossa fortaleza. Por isso, impresso.
Uma boa leitura a todos.