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Meu primeiro indício de que comida era algo mais que uma substância para se enfiar na boca quando batia fome – como que enchendo o tanque do carro – veio no final do quarto ano primário. Foi durante as férias em que viajamos para a Europa a bordo do Queen Mary e aconteceu no salão refeitório da classe econômica. Há uma foto dessa viagem: minha mão de óculos escuros à la Jackie O., meu irmão caçula e eu terrivelmente chiques para o cruzeiro, alvoroçadíssimos com nossa primeira visita à terra natal dos ancestrais de meu pai, a França.Foi a sopa.
Estava fria.
Uma descoberta e tanto para um menino curioso cuja experiência em sopas até aquele momento ia de creme de tomate Campbell’s a canja de galinha. Eu já havia comido em restaurantes, claro, mas essa foi a primeira comida em que realmente prestei atenção. Foi a primeira comida de que gostei e, mais importante, de que me lembro de ter gostado. Perguntei ao nosso paciente garçom britânico o que vinha a ser aquele líquido deliciosamente fresco e saboroso.
“Vichyssoise”, foi a resposta, palavra que até hoje – mesmo agora, uma veterana cansada de guerra de tantos cardápios, preparada mais de mil vezes por mim – ainda guarda um tom de magia. Lembro-me de tudo sobre essa experiência: a forma como nosso garçom tirou-a de uma terrina de prata com a concha, o frescor das cebolinhas verdes francesas que ele colocou por cima para guarnecer, o gosto cremoso e forte do alho-poró com batata, o choque agradável, a surpresa de saboreá-la fria.
Não me lembro de muita coisa mais a respeito da travessia do Atlântico. Assisti a Boeing Boeing com Jerry Lewis e Tony Curtis no cinema do navio e a um filme com Bardot. O velho transatlântico tremeu, roncou e vibrou que foi um horror a viagem inteira – cracas no casco era a explicação oficial – e de Nova York a Cherbourg foi como cavalgar um cortador de grama gigante. Meu irmão e eu não demorados a nos sentir entediados e passamos grande parte do tempo no “salão jovem”, ouvindo “House of the Rising Sun” na vitrola eletrônica ou vendo a água se mexer para lá e para cá feito um vagalhão contido entre quatro paredes na piscina de água salgada do convés inferior.
Mas aquela sopa fria nunca mais me deixou. Ela ressoou, me acordou, me deixou consciente da língua e, de alguma forma, me preparou para os acontecimentos futuros.