Osny Tavares: Um olho na estrutura, outro na dialética

Coluna de ombudsman extraída da edição de abril de 2021 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos ombudsman, clique aqui.


Jornal pressupõe jornalismo? Inicio essa coluna com um beliscão num tema recorrente entre a comunidade do RelevO. Cito resposta do editor a uma correspondência publicada na edição anterior: “Geralmente, nós publicamos textos com caráter menos jornalístico. O foco é a seleção e publicação de novos autores e autoras contemporâneas”. 

Se a costura do jornal são os contos e poesias, os textos de análise são os patches que lhe dão o colorido. Retomando a já saudosa tradição dos suplementos de crítica dos grandes jornais, temos encontrado aqui interessantes comentadores da cultura. Março nos trouxe uma crônica sobre o bicheiro Castor de Andrade (Enclave) e uma resenha sobre coletâneas de Nelson Rodrigues (Laércio Becker) – decerto, duas oposições que tensionam o carioquismo. De forma similar, Elton Mesquita fala sobre as trocas simbólicas entre Brasil e Portugal, ou a falta delas. 

Assim, o periódico se revela sartreanamente vesgo: um olho aponta para a estrutura; o outro, para a dialética. Dessa junção, constrói sua atualidade. Embora não seja propósito dessa publicação, a formação de repertório é condição fundamental para a comunicação cultural. Seja na crítica, seja na produção ficcional, a referência é a matéria-prima do sentido textual. 

A escrita pressupõe leitura, que pressupõe tempo passado. A pauta do RelevO faz visitas sociais à estante dos lançamentos, mas se conforta na sessão dos clássicos. Experimenta o novo tangenciado no perene. 

Como registro de seu tempo, esse jornal tem o desafio de ser contemporâneo sem sucumbir à pauta novidadeira. Para isso, tem optado por acompanhar menos a agenda de lançamentos das editoras comerciais. Essa escolha o distingue das resenhas que predominam na internet, onde as breaking news da literatura ressoam com mais intensidade. 

Emitir juízos antecipados é caminho fácil para o constrangimento. Todo jornalista cultural já deve ter repassado mentalmente suas apostas e se perguntado onde está tudo aquilo agora. Contudo, a segurança do cânone não pode enrijecer precocemente a musculatura analítica dessa plataforma.