Louis Vuitton, mestre das malas

Extraído da edição 57 da Enclave, a newsletter do Jornal RelevO. A Enclave, cujo arquivo inteiro está aqui, pode ser assinada gratuitamente.

Existe uma diferença significativa entre o primeiro baú – de topo arredondado – e o segundo – retangular. Para constatá-la, basta juntar vários destes objetos: uma pilha de unidades do baú retangular se manterá em seu devido lugar, ao passo que uma pilha de unidades do baú arredondado formará um caos semelhante a uma rodada de Tetris encerrada precocemente.

Essa desordem em nosso cenário hipotético prejudica os objetos contidos em cada baú arredondado. Por sua vez, o cenário hipotético já não foi apenas hipotético: muito antes das malas com rodinhas (“Como é possível conceber que se passaram quase 6 mil anos entre a invenção da roda e essa implementação brilhante (por algum fabricante em um monótono subúrbio industrial)?“) e dos extravios em Guarulhos, viajar exigia um empenho logístico maior do que um check-in no app da Latam.

Na metade do século 19, durante ou depois da Revolução Industrial, para se deslocar era necessário subir em uma carruagem, barco ou no recém-desenvolvido (e lento) trem. Nesse contexto, um sujeito muito astuto otimizou a maneira como indivíduos poderiam carregar e guardar suas bagagens. Pelo título do texto, você deve imaginar a quem nos referimos, o que remove qualquer margem de surpresa.

O adolescente Louis Vuitton (1821-1892), antes de ser simulacro de camelódromo, tendo perdido pai e mãe, saiu de Anchay – a pouco menos de 500 km da capital – para morar em Paris, onde se desenvolveu na confecção de bagagens sob a tutela de Monsieur Maréchal.

Com o tempo, Vuitton se tornou empacotador oficial da corte (com ô) francesa – pense num cara bom com malas, não é mesmo? Hahahahaha… Era ele, portanto, o responsável por organizar os baús de ninguém menos que a imperatriz Eugênia, esposa de Napoleão III. Também era responsável por fabricá-los (os baús, não os monarcas).

Além da experiência, isso lhe rendeu clientes, contatos e, claro, status. Quando Vuitton abriu a própria loja, na década de 1850, o transporte ferroviário crescia. No fim dessa mesma década, Louis Vuitton implementou seus inovadores baús retangulares. Ele havia se inspirado na marca inglesa H. J. Cave, creditada como a primeira a confeccionar bagagens de mão.

A engenhosidade de Louis Vuitton lhe valeu a consagração, que perdura até hoje. Por sua vez, o logotipo da LV foi desenvolvido após a morte do criador, já visando a impedir falsificações. Mérito de seu filho, George, que também ajudou a criar o sistema de trancas nas bagagens – até então (estamos falando das últimas décadas do século 19), qualquer um podia furtar os pertences contidos nas malas. Como no aeroporto de Guarulhos!