Baú: Richard Yates

Extraído da edição 65 da Enclave, a newsletter do Jornal RelevO. A Enclave, cujo arquivo inteiro está aqui, pode ser assinada gratuitamente. O RelevO pode ser assinado aqui.

E ela jamais conseguira explicar, nem mesmo compreender, que o que adorava não era o emprego – qualquer emprego serviria –, nem mesmo a independência que o emprego lhe propiciava (embora isso fosse importante para uma mulher sempre à beira do divórcio). No fundo, o que ela adorava e precisava era do trabalho em si. “Trabalho duro”, seu pai sempre dissera, “é o melhor remédio para todos os males do homem… e da mulher”, e ela sempre acreditara nisso. A pressão, a agitação e as luzes do escritório, o almoço rápido entregue numa bandeja, o despacho de papeis, e o atendimento de chamadas telefônicas, o cansaço das horas extras e o grande alívio de tirar os sapatos à noite, num cansaço que sempre a deixava inerte, com força apenas para tomar duas aspirinas, um banho quente, comer um jantar leve e cair na cama – eis a essência do que ela adorava; era isso que a fortificava contra as pressões do casamento e da maternidade. Sem isso, conforme costumava dizer, teria enlouquecido.

Richard Yates, Foi Apenas um Sonho (Rua da Revolução), 1961. Edição brasileira da Alfaguara, 2009.