Extraído da edição 46 da Enclave, a newsletter do Jornal RelevO. A Enclave, cujo arquivo inteiro está aqui, pode ser assinada gratuitamente.
A relação entre guerra e moda é muitíssimo forte – nós até já providenciamos alguns exemplos na Enclave 42, e também já tratamos do fraque. Um dos exemplos mais clássicos da convergência entre esses dois campos cabe ao trench coat, aquele casacão belíssimo visto em pessoas elegantes no inverno. E em detetives sombrios, mas chegaremos lá.
O trench coat (casaco de trincheira, ao pé da letra) é facilmente reconhecido: um agasalho extenso, do tamanho de um sobretudo, com duas lapelas largas, botões e um cinto que afunila a cintura de quem o veste. Tradicionalmente na cor cáqui, hoje é produzido em outras colorações (entre as alternativas mais comuns, cinza e preto).
Inicialmente concebido no início do século passado pelas marcas Burberry e Aquascutum, ambas britânicas e ambas careiras, o trench coat nasceu como item opcional do Exército Britânico. Era uma alternativa mais leve em relação ao sobretudo. Seu tecido – a gabardina – havia sido inventado por Thomas Burberry no final do século 19. Na Primeira Guerra Mundial, já foi presença constante entre os soldados britânicos.
Impermeável e provido com vários bolsos e fivelas, caiu nas graças dos soldados, que não o abandonavam após voltar das batalhas. Durante a Segunda Guerra, estava estabelecido – outros países já haviam confeccionado seus trench coats.
Sua popularização entre civis se deu por meio do cinema. Humphrey Bogart em Casablanca (1942) e Peter Sellers nos filmes d’A Pantera Cor de Rosa popularizaram de vez o item, que na década de 1960 já caía no gosto de moderninhos em geral. Você pode comprar um trench coat igual ao de Bogart na própria Aquascutum por R$4.715, por que não? Na Burberry, um modelo feminino está à venda por R$ 14.540.
A essa altura, as telonas também já haviam solidificado o gênero noir: detetives alcoólatras, art déco, femmes fatales, traições perversas. Humphrey Bogart, sempre ele, havia auxiliado na montagem do arquétipo, vide as adaptações de Falcão Maltês (1941) e The Big Sleep (1946). Passado o tempo, o trench coat se consolidou como um clichê do noir. Basta equipá-lo com um fedora, um maço de cigarros e bastante mal-humor para você se pagar de Philip Marlowe por aí.