Silvio Demétrio: Luto pela poesia

Coluna de ombudsman extraída da edição de dezembro de 2016 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos ombudsman, clique aqui.


Este resto de epílogo de um ano cruel e tortuoso parece demonstrar um esgotamento do sentido em todos os níveis. Para muito além de qualquer polarização política ou partidária, todos se sentem traídos: seja pelo destino ou pelo acaso com a exorbitante tragédia que solapou as vidas de quem estava a bordo daquela aeronave que levava a equipe da Chapecoense (não há como não falar disso), seja pela decadência exposta de todos os parâmetros aceitáveis para a política em condições democráticas que se demonstrou com as manobras torpes, tanto do Senado com a aprovação da “PEC da morte”, quanto nas “10 medidas para acabar com a corrupção”, que o Congresso transformou a seu bel prazer e conveniências. Daqui em diante são vinte anos de inércia. Uma glaciação tropical. Não há bálsamo para uma ferida assim, especialmente quando o jornalismo é instrumentalizado como dispositivo que arranha a carne exposta do real, pervertendo a dor e a comoção nacional numa passividade bovina da população que se esquece de Brasília, do Brasil e de si mesma. A repetição até a exaustão para que o sentido entre em colapso também.

É aí que se percebe o momento ideal para avaliar o quanto existe de valoroso num jornal que se define pela “linguagem como notícia”. Um jornal de poesia e literatura. Um jornal como ágora estética — encontro de poéticas. Algaravia. Murmúrio do mundo. Glossolalia. É só assim, quando acontece na página uma epifania, que se revela a perspectiva do tempo como via de restauração do sentido. A poesia assim como toda a arte é uma forma de cura. É pelo engenho das palavras que se recupera a fé num mundo, seja ele qual for. Existem vários e eles não se excluem uns dos outros.

O RelevO acerta quando apresenta uma salada dos miolos dessa diversidade. E isto acontece de maneira constante. As páginas da publicação são pluralistas, sempre dando espaço para uma pletora de talentos de diferentes origens, estéticas e recursos de expressão. O periódico não é uma aventura paroquial e incestuosa. Mesmo quando regional, é recomendável a um jornal sempre ser cosmopolita. Mesmo que encrustado na mais febril das províncias. E o RelevO é um cidadão do mundo nesse sentido, basta percorrer suas páginas. A edição de setembro, por exemplo, acertou ao ir do chorinho ao heavy metal. Os textos de Luís Pellanda, Flavio Jacobsen e Karen Debértolis numa mesma edição faz lembrar, e isso é inevitável, os melhores momentos do saudoso Nicolau. Uma publicação de Curitiba para o mundo.

Na edição de outubro um grande acerto foi a publicação do texto do jornalista Diego Antonelli sobre um Paraná que não é nem um pouco pacato. A história da Revolução Federalista e o Cerco da Lapa nos mostram que, tal como no mundo inteiro, por detrás do silêncio de uma paisagem bucólica sempre há o grito sufocado de quem pagou com o próprio sangue o preço da história. E é necessário desmistificar o Paraná. Especialmente quando se cria uma aberração ideológica como a “República de Curitiba”.

Em alguns momentos de vulnerabilidade, o jornal pode pecar talvez por essa vocação paroquial que não é sua, mas do próprio Paraná. Estamos todos imersos no mesmo espírito do tempo e acabamos por contrair suas contradições. Talvez seja hora de expandir o alcance não só da circulação, mas também da abrangência do que se mostra em suas páginas. Existe toda uma cultura subterrânea para além do Paraná e que está ávida para encontrar espaço de expressão. O RelevO pode se tornar essa bússola continental. Encontrar interlocução com uma literatura e uma poesia que são estrangeiras dentro do próprio país, como a verve crua e cortante do maranhense Nauro Machado. O trabalho valoroso do editor Gabriel Cohn com sua Azougue no Rio de Janeiro, assim como a Editora Sete Letras e, porque não, até a Revista Cult. Não existe concorrência nesse meio, senão confluência. Vamos nos juntando até nos tornarmos atlânticos.

Escrevo esse texto para exorcizar as sombras desse mórbido fim de novembro na história do jornalismo e do esporte, assim como na política brasileira. Precisamos nos reinventar. Sempre. Não dá para esperar vinte anos. O avião pode cair a qualquer momento. Do luto, lutemos.

Silvio Demétrio: Krig-ha, Bandolo!

A primeira vez que tive de explicar o que era um ombudsman foi numa prova de proficiência em inglês. Foi na ECA em São Paulo, meados da década de 1990. A prova apresentava um texto sobre a legislação sueca referente à função do “ouvidor” em um jornal. Na época isso era uma novidade relativamente recente no jornalismo brasileiro. A Folha de São Paulo havia começado há algum tempo com a coluna que mantém até hoje. O primeiro ombudsman foi o jornalista Caio Túlio Costa, que foi o primeiro também a lançar um livro explicando o que era um ouvidor dos leitores de um jornal.

Quando me convidaram para assumir essa função no RelevO considerei interessante o desafio, uma vez que essa função é tradicionalmente vinculada ao jornalismo diário, o que se chama popularmente de “hard News”. Um ombudsman traça um arco crítico sobre a cobertura que um jornal realiza. Transpor isso para o contexto de um jornal de poesia e literatura requereria algum engenho. Foi aí que encontrei o desafio que me motivou.

É que desconheço algum exemplo de ombudsman que tenha trabalhado com um material estético e não noticioso.

O RelevO inovou ao implantar os mandatos dos que me antecederam. Em conversas com o editor do jornal, Daniel Zanella me explicou que cada um seguiu uma linha própria, independente, dando-me total liberdade para desenvolver meu trabalho. Parti, então, dos seguintes referenciais como modelo crítico: o ensaio Forma É Poder, que Paulo Leminski publicou no saudoso Folhetim publicado pela Folha de São Paulo em 1982, a concepção do que é uma teoria crítica segundo Max Horkheimer e de uma noção que é cara à linha da Semiótica da Cultura, a intertextualidade, muitas vezes atribuída à Bakhtin, mas que na verdade é desenvolvida de fato por Julia Kristeva.

De Leminski extraio as seguintes afirmações: “Uma prática do texto criativo, coletivamente engajada, tem a função de desautomatizar. De produzir estranhamento. Distanciamento. É desmistificação da “objetividade”inscrita no discurso naturalista. Essa objetividade é falsa. Ela apenas reflete a visão do mundo de dada classe social, de determinada civilização. Sua pretensão a “discurso absoluto” é totalitária”. Essa era sua concepção de uma linguagem crítica dentro do jornalismo cultural. Não há, portanto, segundo esse parâmetro, como ser “objetivo” no jornalismo cultural, a menos que não se queira ser acrítico (coisa que se vê em larga escala nesse modelo de jornalismo cultural como “prestação de serviço”, agenda, que vigora nas mazelas do mercado).

Ainda do poeta paranaense sigo o raciocínio do aforismo seguinte de seu ensaio: “Violação. Ruptura. Contravenção. INFRATURA. A poesia diz “eu acuso”. E denuncia a estrutura. A estrutura do Poder, emblematizada na “normalidade” da linguagem”. Poesia, portanto, é caso de exceção. Aquilo que foge às normas. Uma linguagem fluxo. Descodificação. Desterritorialização. Esse “eu acuso” de Leminski brilhantemente embutindo no enunciado a referência ao famoso Caso Dreyfus que marcou a história do jornalismo europeu a partir da leitura que Emile Zola fez dele.

Como a poesia realiza essa tarefa, então? Na minha concepção, exatamente pela dinâmica da intertextualidade, o terceiro parâmetro de nosso modelo crítico aqui para o RelevO. Intertextualidade é conversa entre textos culturais.

Nada que se escreve e publica é independente. Nada nesse sentido nasce de uma tábula rasa. Um grau zero da escrita, como diria Barthes. Existe toda uma rede de enunciados sobre o mesmo tema e de outros referentes afins que precede o corte que será feito pelo enunciado que antecipa e reage com este último. Aquilo que se pode chamar seguramente de historicidade.

É daí que entra a concepção de Horkheimer do que vem a ser uma teoria crítica. Em seu célebre texto Teoria Tradicional e Teoria Crítica, o filósofo alemão explica, entre outras coisas, que o que caracteriza uma teorização crítica é a possibilidade de se infletir uma perspectiva histórica sobre o objeto da crítica. Fazer crítica é, sobretudo, percorrer os agenciamentos do objeto em suas relações dadas pela perspectiva histórica. Aquilo que se percebe do objeto tal como ele se apresenta no quadro histórico no qual ele emerge e as linhas de derivação pelas quais esse objeto se desloca no devir do tempo.

Meu objeto é o RelevO como um todo. Não me sinto autorizado para realizar alguma crítica sobre a poética dos textos aqui publicados. Não poderia analisá-los como se notícia o fossem. Afinal, um ombudsman não faz crítica literária, senão uma espécie de media criticismo. Como tal, penso que minha função é colocar o que se constitui como publicação em relação à historicidade. Jamais eleger minhas convicções políticas como verdades, uma vez que não acredito ter convicção nenhuma sobre nada. Convicção só tem quem já parou de pensar.

Quero agradecer aqui, no corpo do texto mesmo, pelas observações do leitor Alexandre Cunha, especialmente a comparação com Gregório Duvivier. É isto que nos enche não de convicções, mas de um afeto que nos indica que estamos no caminho certo. Agora com relação ao fato de algum comentário sobrepor-se ao campo político, vamos pensar assim: desde que o oxigênio é uma necessidade comum a todo ser humano e não humano também, o próprio ato de respirar é um ato político. Só não existe política onde não existe mais vida. Xô, uruca!

Silvio Demétrio: “E”

Coluna de ombudsman extraída da edição de outubro de 2016 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos ombudsman, clique aqui.


É uma grande cilada. A ideia de concorrência que, na dimensão do senso comum, quase sempre fica restrita a um sentido de competição, de disputa. Essa é a superfície do termo que vigora pela repetição em uma quantidade considerável de momentos do cotidiano. É como quando pensamos políticos concorrendo a um cargo. Uma eleição é uma concorrência.

Da mesma forma, concorrem empresas no mercado. Espécies na natureza. Ideologias pelo poder. Concorremos na medida exata daquilo que coloca o outro como contradição. Como contrário. E como tal deve ser sobrepujado. Parafraseando Klausewitz sobre a guerra, é possível dizer que o mercado é a luta pela sobrevivência na natureza continuada por outros meios. Uma condição do “todos contra todos”.

Quanta pobreza.

Não há sentido algum em pensar nada relativo à arte e à cultura desse ponto de vista. Ainda mais quando o objeto e uma publicação ou outra. Não há competição. Não há disputa. Coisas como “Guimarães Rosa X Machado de Assis”. Houve um momento assim do jornalismo cultural brasileiro. Não há “melhor”. Não há “vencedor”. Tudo isso é uma tremenda de uma falsa questão.

A arte e a cultura formam sempre uma síntese conjuntiva – conceito que esta lá em O Anti-Édipo de Deluze e Guattari. O “E” agencia um termo ao outro. Tudo o mais é puro espírito de gincana. Coisa para quem nutre preferencias por quermesses. Diga me com quem competes que eu te direi que isso é uma besteira.

E uma das coisas que mais me cativa no RelevO é que ele e impermeável a esse espírito de gincana. Ninguém é nem quer ser melhor que ninguém. Aqui todos são melhores. Até os que não estão aqui. Até os que não acreditam nisso e são contra, porque uma síntese conjuntiva é assim. É um agenciamento maquínico do desejo. É algo que coloca as coisas para produzir.

O desejo é assim. Uma força que os pré-socráticos chamavam muitas vezes de amor – o império de Eros. Quem ama se liga. A conexão como procedimento. Se existe uma concorrência então é sob um novo sentido. Correr em companhia. Correr juntos. Correr “com”. Concorrer e colocar-se em movimento mutuo. Movimentar-se no plural. Co-mover-se.

A arte e a poesia não buscam outra coisa. Aquilo que se compreende por intermédio de uma comoção estética. O movimento, a pulsação que se estabelece e reverbera entre o coração da obra e daquele que a frui. É uma compreensão pelos sentidos. Não há como mensurar. Aqui a ordem do valor é puramente qualitativa. Antes de tudo, qualquer signo na arte é um qualissigno. Uma intensidade. Indomável completamente pela razão. Tal como uma experiência religiosa, incomunicável. Singular.

Singularidades não competem. Não se disputam. Apenas se afirmam em sua plena potência. É de singularidades que se constrói o múltiplo. Como qualquer relevo – a topologia como expressão da diferença, assim como na música acontece com os timbres (qualidade que torna único cada instrumento tal como única e cada voz).

Arte não se troca. Poesia não se quantifica. Não se pode entender nada em estética senão pelo viés do valor de uso. As singularidades como fundamento e historicidade. Só existe um mercado em relação a isso como algo externo, como uma lógica estrangeira que se impõe sobre a produção de quem trabalha o sentido como matéria prima.

É nessa dimensão que a arte e a poesia podem contribuir plenamente para uma volatilização desse panorama canhestro que vivemos nesses dias de muita política e tão pouca beleza. Uma pedagogia da diferença e do convício inclusivo. Chega de tanto mercado. Essa tristeza e solidão de quem quer ser melhor a qualquer custo. Ser singular é nunca ser só por se estar sempre no plural, na multiplicidade. Só existe paisagem para se ver quando há RelevO. Viva a Relevância de cada um, de todos. Viva a paciência do editor que esperou pela confusão deste que vos escreve para que o jornal contivesse também esse texto escrito a suor e sangue no começo de uma noite abafada de domingo sem inspiração e qualquer insight. Acima de tudo, viva a vontade de viver para além das sombras desse oco histórico no qual nos metemos. Só a arte liberta.

Silvio Demétrio: Em atrito com a pele do real

Coluna de ombudsman extraída da edição de setembro de 2016 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos ombudsman, clique aqui.


Não há como não falar. No exato momento no qual escrevo esse texto opera-se uma disjunção entre o tempo cronológico e o tempo histórico em nosso pais. O inexorável transcorrer do dia a dia continua inabalado, mas a percepção e a perspectiva desse movimento como sentido histórico alterou-se com os últimos acontecimentos políticos no país.

Não consigo desviar desse obstáculo obsessivo. Tentei. A ideia era escrever sobre o por quê de se ler ainda no universo do impresso. Tecnologia, tempo real, convergência, alcance global, tudo conspira contra o impresso. Enfim, era para ser um texto abordando somente isto. E já é coisa muita. Porque o impresso resiste. E uma forma de resistência. E resistir à corrente do não sentido é a única forma de se produzir história, poesia e sentido.

A extração de Mallarme: “um coup de dés jamais n’abolira le hasard”. “Um lance de dados jamais abolira o acaso”. E aqui, em nosso caso, “coup” também pode ser traduzido por “golpe” (coup d’etat = golpe de estado). Quanta civilidade foi deteriorada nas redes sociais pela discussão sobre o que assistimos nesses dias ser ou não ser um golpe. Consumado agora já está. Sendo ou não sendo. E todo mundo dança nesse lance.

O que importa é “não abolir o acaso”. Do ocaso de uma transparência maior de nossas instituições cuidemos bem de preservar o improvável como limite. A velocidade da sorte de nossas liberdades que não se deixam capturar. O texto empapelado jamais desaparecera porque só se faz história impressa. Só se faz história com as marcas. Existe algo de indicial no impresso. Derrida atribui a escrita uma primazia sobre a fala por ter sua origem ligada a um sentido de demarcação. Toda escrita é territorial. Demarca um território. Uma fronteira. O papel da página como a película do real.

Mesmo que a página e o papel sejam simulados por uma matriz algébrica que você não percebe no branco da tela de um monitor. Essa película permanece. Resiste. Continuaremos produzindo e lendo as impressões desse mundo. Porque assim e diferente. Imprime-se o que se escreve para que disto algo fique. Uma demarcação sobre o deserto do acaso.

É daí que percebo uma ligação entre o tema que iria abordar nesse texto e a opacidade do momento histórico que me embaralha as ideias às percepções. O que vai ficar disso tudo? Quais as impressões, as marcas, as pistas? O registro ativo. Não um conjunto de narrativas. Opiniões qualquer um as tem. Mas há um jogo em forma de batalha na história: o embate entre a razão emancipatória e a razão instrumental.

Prevalece na história a primeira. As razoes instrumentais sempre se dissolvem em sua parcialidade. Que Curitiba se cure da “Republica de Curitiba”. Um rançoso e requentado separatismo sulista por debaixo de uma carapaça de desonestidade intelectual. Perversão mesmo. Um mccarthismo tupiniquim reeditado de forma palatável à classe média conservadora que sempre “marcha com Deus Pela Família”.

Quanta caretice ainda é suportável até que se perceba essa armadilha? Detesto, senão odeio, escrever com interrogações assim. É amador. Mas é que está sendo difícil produzir essa marca no tempo aqui nessa película do real. Nunca foi tão palpável perceber o que Adorno queria dizer com a expressão “o engodo das massas”. Deveríamos erigir um monumento naquela esquina próxima ao Teatro Guaíra na qual a atriz Letícia Sabatella foi hostilizada. Um monumento à coragem da mulher. Um marco sobre a cidade como um enunciado sobre uma página.

Marcar a felicidade de ainda se ter coragem. De se ter graça. De não ser triste. Essa Curitiba imersa em sensibilidade e mistério e que deve sobreviver ao mau gosto dos shoppings centers. Não podemos abolir o acaso de nossas esquinas. Deixar que nos roubem o sagrado direito de querer e de não querer. Ir e vir por onde quer que seja. Com os pés ou com a cabeça e a alma.

É assim que vejo uma resistência do impresso como algo fundamental. Alegoria de uma forma de ser. Possibilidade de vida. Porque lemos também com as mãos.

Elas fazem parte da moldura que estabelece uma continuidade entre a película do real da página e a nossa epiderme. Como dizia Valery, “o mais profundo é a pele”. Não abandonamos algumas coisas por simples hábito, é o argumento de

Umberto Eco para legar sua fé no livro impresso. É esse rocar de peles, o fino toque entre o mundo sensível e o inteligível que se dobra formando a figura de um leitor. Existe uma subjetivação da leitura que extrai sua forma do universo do impresso. Isso sempre permanecerá, mesmo que na aufhebung (supressão conservadora) de uma tela digital.

Acho que consegui chegar a alguma coisa com esse texto. Espero. Se assim não o foi, que o leitor e o RelevO me perdoem. Foi história demais nesses últimos dias. Até gripei. Saúde e sorte, sempre, para todos nós.

Silvio Demétrio: No mínimo

Coluna de ombudsman extraída da edição de agosto de 2016 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos ombudsman, clique aqui.


Aqui mais uma vez eu e você estamos. Você aí do lado de fora da página e eu daqui dentro desse silêncio. Apenas uma voz que se deixa imaginar pelos seus olhos. Algo que nunca será superado é a sensação de se abrir um livro ou jornal impresso como quem descortina uma cena. A página é um palco imaterial. Uma tela. O silêncio. A iminência. Um véu que se levanta para ver mais além. Vidência e sinestesia. Mundos que se pode tocar com o avesso das pálpebras. Eu e você já estamos lá, exatamente agora. Esse lugar sagrado que existe no intervalo entre o que poderia ser e o talvez. Aquilo que se cogita. Aquilo que se agita e insiste por entre as palavras. Não dá para misturar isso com essa mesquinhez que se chama realidade. A miséria da vida como mero fato finito. Aquilo que se deixa caber numa planilha de ganhos e despesas. A arte é aquilo que a vida pode ser para além dela mesma. A grandeza da vida. O que faz valer a pena cada fôlego que se respira. É só para os raros. Afinal de contas, nem todos vivem. Essa é a história. O sentido. Ele não existe porque deve ser produzido. Ser a mais. Devir.

É que tudo passa a ser. Tudo se move. Tudo se passa ao ser. Uma página é uma potência. E para trabalhar com algo assim se exige muita sensibilidade. Porque qualquer movimento brusco ou indelicado pode por tudo a perder. É necessário despir-se de qualquer avareza. A arte é da mesma natureza da generosidade. É por isso que não existe “Eu”. “Eu é um outro”, como no verso de Rimbaud. Não pode existir “Eu”. Senão tudo dança.

Encrusta-se alguma prosódia clandestina assim quando se tem de falar na transversal sobre uma das muitas pedras que se espalham pelos caminhos de alguém que leva no heroísmo uma publicação como o RelevO. Vejam só: até agosto fica bonito quando se deixa a arte ser o que ela é. A edição desse mês está pura dinamite. É lindo ver isso acontecendo. Quem não se sente muito pequeno dividindo uma mesma encadernação com talentos como Luci Collin? A diagramação está atenta para o que a poesia sempre nos ensinou graficamente. Os espaços em branco são tão importantes quanto. Isso é respeito pelo leitor. Pelos olhos que tornam essas virtualidades e potências das páginas num mundo de vozes que constroem algum sentido de toda essa algazarra (como são lindas as palavras que nos legaram os mouros).

Em tempos de uma imprensa lamentável que transformam rifles de paintball em fuzis terroristas com um golpe de recorte é que se vê o quanto é crucial aprender com a poesia a se respeitar o todo — e isso inclui do leitor ao referente. Nunca se precisou tanto de poesia e arte. Por destino e sorte nosso RelevO ganha uma abrangência maior, passando a circular em mais cidades. Um verbo precioso: transbordar. Ir para além dos limites. Exceder as fronteiras. Desterritorializar-se. Mais além, mais além.

Quem não saca isso não percebe o quanto é minúsculo o toma-lá-dá-cá que se propõe insidiosamente à redação quase que diariamente. Algo como “eu te mando um texto e você me dá uma assinatura”. Literatura, poesia e arte sempre nasceram de gestos heroicos. A equipe que produz o periódico passa por grandes pauleiras em absoluto silêncio. É porque isso não interessa nem aos leitores e muito menos à própria equipe. Problemas são coisas que se desconstroem. E se deixa lá. No vácuo escuro. Porque o que interessa é “ocupar espaço e poetar conforme o caso”, como poderíamos entortar algo que o Torquato Neto deve ter escrito em algum momento. Assinaturas do jornal são de responsabilidade da administração. Não existe qualquer poesia e arte nesse campo. Administradores apenas administram, quase sem nenhuma poesia. E é por isso que existem as páginas pagas. Mesmo assim, todos os valores do RelevO são módicos (daí a resistência da poesia até nesse detalhe de ordem administrativa). Desconheço outra publicação que consiga imprimir tanta personalidade aos anúncios. Todos são criações de artistas gráficos que fazem tudo no mesmo espírito de toda a equipe e colaboradores: pelo prazer que rima com a generosidade de ver acontecer.

Aqui tudo é símbolo. O domínio do arbitrário como exercício libertário. Deixe acontecer que tudo rola. “Deixe sangrar” como Gal Costa em “A Todo Vapor”, disco emblemático produzido pelo saudoso Waly Salomão, de quem sempre me lembro do aviso: “Cave Canen”, “cuidado com o cão”. Beware of Darkness. Ele me dizia dos perigos dessa fogueira das veleidades chamada mundinho literário. Baudelaire atualizado para uma realidade pequenomesquinha: quando um homem visita outro que está enfermo é só para certificar-se da superioridade de sua própria saúde. Bicho, não vá perder-se por aí. O perigo é você engrossar o coro dos contentes que agora batem panelas e agridem atrizes pelas esquinas do lado de fora do teatro.

Abaixo o lamentável, o postiço. O ilegítimo. Chega de picaretagem. Chega de tristeza. “Gente é feita para brilhar”. Sucesso é coisa careta. O barato é o sentido. Como o sapo de Bashô que pulou no tanque. Uma pedra que rompe a superfície e a transforma por reverberar em movimento o som que já não é mais do que a memória do próprio salto. Fiquemos à espreita de algo. Esse é o método. A atenção. Dos ouvidos aos olhos. O tato. Aspire. Do ar queira. Cogite. Mas também desobedeça.

Enquanto eles dormem nós sonhamos. Em honra e homenagem ao que podemos ser: não acorde. O que significa que é para não dormir no ponto. Quem cobra favor é porque antes de tudo suborna a si mesmo. Vamos ser de verdade. Para além dessa vontade minúscula e enferma de encher o próprio bucho com a carniça dos desejos mortos de alguém. Abutragem. Urubulice. Neologismos-traquitanas disfarçados de palavras-valises.

Que esse agosto seja leve e lindo e que dessa viagem o RelevO da paisagem, uma promessa de aventura e fé no sentido. Cresceremos na mesma medida que nos tornarmos menores. Como Alice. Beba-me. Leia-me. Decifra-me ou te devoro. Assim como fiz com Silvio Demétrio nesse texto. Para você que me leu até aqui o universo e tudo o mais. O máximo.

Silvio Demétrio: O fiel

Coluna de ombudsman extraída da edição de julho de 2016 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos ombudsman, clique aqui.


Um dos mitos mais interessantes da imprensa é o jornal “Libération”, o “Libé”, como carinhosamente e conhecido por seus leitores. É que em 1973 o jornal teve como um de seus fundadores a figura de Jean-Paul Sartre (ele foi seu editor durante algum tempo). A reverberação do maio de 68 ainda era muito forte e a publicação nasceu com uma alma profundamente marcada por um desejo libertário. Em sua primeira fase, não abria espaço para publicidade. Sua receita baseava-se na venda em bancas e no público assinante, equação cujo resultado qualitativo era uma independência radical em relação a condição editorial dos outros jornais. E assim o foi por quase uma década. No começo da década de 1980, o modelo arcou-se a concessões e passou a abrigar anúncios publicitários. No entanto, o mito já tinha nascido. A ideia de um jornal como uma entidade autônoma e independente. Hoje o “Libé” e um jornal convencional do ponto de vista empresarial – desde 2005 conta em seu quadro de acionistas com os 37% de Edouard de Rothschild. Sim, o Libération alimenta-se hoje de seu mito fundador.

Outro mito é a retumbante joia editorial da contracultura, a “Rolling Stone” (a americana). Nascida na florida San Francisco dos cabelos longos da década de 1960, hoje a publicação não e nem mais sombra do que foi em seus áureos dias de fúria contracultural. O que antes era independência e organicidade com as transformações culturais de seu tempo transformou-se numa tradicional publicação gerida por um espirito empresarial que a transformou numa franchising. Sim, a convencional publicação brasileira que ostenta hoje a logo da franchising anima-se de toda essa complacência normalzinha – só lembrando a heroica luta de Luiz Carlos Maciel, nos anos 1970, publicando uma versão nossa e verdadeira da “Rolling Stone”, que realmente tinha alma de pedra rolante. Maciel, o também jardineiro da Flor do Mal que Torquato Neto tanto amava.

Entupir ou não entupir, eis a contradição. Entupir de anúncios. Engasgar as páginas com a necessidade de grana. Esta parece ser a grande questão. Até onde se pode ir sem comprometer aquilo que torna uma publicação viva. Difícil balança cujo fiel oscila entre o público leitor e o público anunciante. Não se vive sem ambos, e ambos deveriam entender que não se pode excluir tanto um como o outro. O fiel dessa balança oscila entre a ameaça de derrocada de todo romantismo que peca pela falta de continuidade, assim como a sobrevivência esvaziada de crítica porque só atende aos interesses de quem está pagando pelo espaço publicitário. Jornalismo é o supremo paradoxo entre o público e o privado. Não é diferente quando o assunto é literatura e cultura em geral.

Valha-me são Pierre Bourdieu para evocar a noção de campo. O jornalismo é um campo. E, como tal, é palco de disputas simbólicas. Qualquer resultado nesse sentido será sempre provisório. Inconstante. Instável. E isso é bom. Saudável. Editar é uma arte do equilíbrio, essa tara por atravessar precipícios a passos sustentados por barbantes. E quase voar. É necessário saber voar para além da gravidade das demandas dos dois lados da balança. E construir a confiança de que o público leitor e os anunciantes vão estar ali, sustentando um sistema sempre instável como a vida de um trapezista. E só assim que se pode ser justo tanto com quem paga pelo conteúdo quanto com quem paga pelo espaço. É certo que esse último paga mais, isto porque, para além do espaço comprado, está pagando pela atenção do público. Esta só existe quando o jornal consegue estabelecer uma justa medida de ambos os interesses.

Ao que parece, o RelevO é uma publicação com alma. Senhores(as) anunciantes, não nos esvaziem daquilo que anima o desejo do público leitor que vocês também querem conquistar. Da mesma forma, senhores(ras) leitores(as), continuem a nos prestar seu apoio com o carinho com que viram cada uma dessas páginas. Elas foram criadas uma a uma antes de serem reproduzidas por uma maquinaria infernal dessas que nos transformam todos em robôs superprodutivos. Aos assinantes, sempre a nossa saudação mais cara, porque estamos o mais próximo o possível. E com os assinantes que se constrói a imagem desse equilíbrio: um leitor que acima de tudo também paga, mas que não esgota seu significado nesse ato. E um leitor orgânico porque indiretamente participa mais de perto de todo o processo de produção. Um assinante e quem dá um voto de confiança. Identifica-se. Só lembrando aqui a vinculação do “Libération” com um certo imaginário de maio de 68, tornando-se, durante muito tempo, sua leitura quase que uma credencial crítica. Ostentar um exemplar do jornal em espaço público era ingressar numa ordem simbólica libertaria. De certa maneira e guardadas as diferenças, a alma do bravo RelevO é assim também.

Escolhi o assunto porque essa e a grande luta anônima que se trava no silêncio dos intervalos que separam as edições. Tempos incertos. Tempos de crise. Jornalismo vive de crise e incertezas. O resto é marketing. Jornalismo é risco. Tem que pagar para ver. Por mais que se tente, não se consegue fechar planilhas nesse universo. Se elas se fecham absolutas, sem nenhuma imprecisão, é porque o jornalismo já contraiu a peste. O RelevO é o que e porque manteve-se no imponderável equilíbrio sobre essa linha ao longo do seu tempo de existência até aqui. E vai continuar assim até onde for possível: pautando-se pelo interesse tanto de seus leitores quanto de seus anunciantes sob o fiel de uma balança que se constrói com a arte de entrelaçar palavras. As artes do texto. São elas que unem todos os nossos interesses num só desejo. Vamos todos celebrar. A linguagem é uma grande festa!

Silvio Demétrio: Nada é sagrado, tudo pode ser dito

Coluna de ombudsman extraída da edição de junho de 2016 do Jornal RelevO, periódico mensal impresso. O RelevO pode ser assinado aqui. Nosso arquivo – com todas as edições – está disponível neste link. Para conferir todas as colunas de nossos ombudsman, clique aqui.


Espero estar à altura. Ser ombudsman não é uma tarefa fácil. Ainda mais com a velocidade que a tecnologia hoje imprime ao tempo vivido. Criei-me em meio a uma geração de fronteira que impunha a imagem de um universo no qual o jornalismo estava ligado organicamente à celulose. Difícil é desapegar-se do papel. É que quando se fala em jornalismo impresso fica como metáfora a ideia de uma marca que se deixa. Uma “impressão” que se causa. Tudo isso numa paisagem cujo protagonista é o leitor. O jornalismo como algo que assinala as subjetividades: quimera que só se materializa quando ele é monstruosamente literário. Daí esse reencontro com o mundo do jornal ainda impresso como resistência quando recebo o convite de Ben-Hur Demeneck para sucedê-lo como ombudsman aqui no RelevO. Invisto-me então dos poderes do machado viking que me foi passado. 

Também não acredito nem no jornalismo e tampouco em qualquer literatura como haute culture. Daí o título que roubei de um livro de Raoul Vaneigen, figurinha carimbada do meio de 68 – “Nada é sagrado, tudo pode ser dito”. A reverência é a miséria da escravidão estética. Por pura coincidência e sincronicidade conheci a publicação alguns dias antes do convite. Um aluno meu da UEL havia chegado de Curitiba e me passou o exemplar. Não discuto com sinais dos deuses do chumbo e da celulose. Por natureza, todo aquele que escreve é um ser obsessivo (não é meu esse insight não, tunguei do Ricardo Piglia, o melhor dos escritores argentinos vivos). E não existe obsessão sem redundância e acaso. Porque redundância e acaso fecham a equação das coincidências – as flores do mal (conhecidas como oximoros) que povoam a “floresta de sinais” dessa zorra toda que fede a enxofre e poluição que se chama vertigem de estar vivo. É tudo meio gratuito mesmo. As coisas vão acontecendo e quando você se dá conta aqueles discos que você ainda considera novos já completaram mais de vinte anos. Para mim esse mandato dura ad nauseum, ou seja, até que vocês se enjoem de mim. Vai ser uma longa e estranha viagem. 

A primeira impressão que tive foi analógica. Tal como num disco de vinil, percorri o RelevO com olhos nos dedos, assim como numa agulha de um toca-discos se instalavam ouvidos. O inaudível atrito das pontas dos dedos sobre os sulcos da celulose do papel chegando ao oco que separa os ouvidos como caixa de ressonância. Quando amplificado esse som em imagens acústicas (valha-me São Saussure), o resultado me sabe ao bom e velho rock’n’roll. Não qualquer um, mas algo de cepa psicodesbundética. Uma longa jam session. Aquele santo graal que sempre se procura numa primeira página: “10 dicas para que seu cabelo continue uma bosta”. É isso. Nenhum outro jornal publicaria isso em sua capa hoje e sempre. Uma ruptura com a sentença bidimensional de Euclides para incorporar à página uma topografia, essa ciência do amor ao irregular. O legado de todo RelevO é a paisagem. O detalhe. A singularidade.

Manchete: a notícia morreu. Só existem os acontecimentos. Sem hora e local definidos. Sem a priori. Tempo de irrupção. Erupção. Lava. Lavra. Palavra. Porque um jornal também pode ser dionisíaco. Sugerir ao invés de nomear. Isso para não suprimir três quartos da pensão “O Prazer do Poema”. Porque o deus dos hebdomadários, diários, gazetas e pasquins também é Hermes, o deus mensageiro. Da aurora e do acaso. O deus da curvatura do tempo que se fecha sobre si ao longo de um dia. A luz do sol é curva. Oblíqua. Porque um texto sempre esconde na exata medida que também revela. Acima de tudo deve restar algo informe, uma “parte maldita” de tudo o que se escreve, o implícito, sublime feitiço de toda enunciação. O que se quer dizer? Um sujeito indeterminado. Hecceidade. Subjetivação sem sujeito. Irrupção do desejo como acontecimento e disparo do sentido sob a superfície fantasmática da linguagem.

Alguém com uma arma apontada para o leitor na capa. A última edição do RelevO (maio 2016). Estamos todos com as mãos ao alto. Aliás, já parou o leitor para pensar o quão é polida essa forma de interpelação dos assaltos que se cometem em língua portuguesa? “Mãos ao alto”. O que cansa no jornalismo convencional é que ele é potável. Falta ruído. Distorção. Faltam entranhas. É o império da rotina. Contra isso tudo só pode vencer a invenção. Sub-versão dos fatos pela maneira de dizer. 

Em verdade, não é viking. Meu machado é de Assis. Assim como São Francisco, despir-se de tudo o que é desnecessário. A mais preciosa das preposições de Italo Calvino, a leveza. Porque o mais difícil de se alcançar com a palavra é a simplicidade. Uma virtude estoica. Não o pouco. O raso. O apenas. Mas sim a potência do silêncio como luz que revela um mundo em cada palavra cavada na página. 

É assim que agradeço pela chance de colaborar com esse grande barato que é o RelevO. Espaço para ecos que vêm de uma multiplicidade de outras grandes festas: nosso saudoso Nicolau, assim como o Joaquim; Grimpa e Revista Coyote; Revista Medusa; a Musa Paradisíaca; isso para ficar no quintal de casa.  Por cima do muro dá para ver o eco dos ecos de outros tempos: o jornal O Beijo, Bondinho e o Flor do Mal (do mestre Luiz Carlos Maciel), e por que não, até o San Francisco Oracle, o supremo jornal psicodélico de todos os tempos, editado por Allen Cohen. 

Tal qual César às margens do Rubycon, “alea jacta est”. O que também pode ser entendido como “se segura malandro, pra fazer a cabeça tem hora”. Chegou a hora e a vez do RelevO crescer. Para o alto e para baixo. Ao redor e dentro da cachola de qualquer um que se permita embaralhar com suas páginas. Como dizia Torquato Neto “o barato é ocupar o espaço e depois poetar conforme for”. Que seja então. Ainda. (sempre quis terminar um texto com parênteses, assim, explicando um final em fermata, em suspenção, para deixar no ar alguma promessa que só conto qual é na próxima edição – e eu só poderia hifenizar dentro de parênteses aqui, porque qualquer outro editor já teria me escorraçado – é por essas e outras que o RelevO é singular).